sexta-feira, maio 18, 2007

ENTREVISTA














Batem à porta.
-Entre, entre por favor!
-Bom dia, venho pelo lugar que anunciaram no jornal de ontem.
-Sente-se por favor, sente-se. Tem o seu curriculum consigo? Obrigado. Hum… duas licenciaturas, dois mestrados, quatro línguas, oito anos de experiência, muito bem, muito bem. Penso que o lugar será ideal para si. Alto…, que aborrecimento. Lamento imenso mas afinal é impossível admiti-lo na nossa empresa.
-Mas…, porquê?
-É que o senhor chama-se Maurício e já cá trabalham dois Maurícios; Como entenderá traria alguns problemas de funcionalidade. Não seria operativo em termos de comunicação interna.
-Mas, vai-me recusar apenas por isso?

-Compreenda, teria muito gosto em tê-lo na equipa, mas a empresa tem normas muito definidas acerca de casos assim.

-Por favor, preciso muito deste trabalho…
- Hum…, bem vistas as coisas poderia abrir uma excepção. Se mudar de nome… Olhe temos em aberto... Vital e Capitulino, assim de repente...

-Vital! Vital estaria muito bem por mim se…
-Excelente fica Vital. Continuando, onde mora?

-Moro em Alcabichóbe!
-Impossível, vai ter que mudar de casa. É que já temos duas pessoas que moram lá e isso é o máximo permitido pelas normas da empresa. Sabe como é a proximidade fora do trabalho pode criar conluios e problemas à posteriori. Ainda se fosse Além de Cima ou Oliveiras.
-Bem… posso mudar-me para casa de um cunhado em Além de Cima.

-OK. Já agora, é casado, solteiro? É que não menciona no curriculum?
-Sou casado e tenho dois filhos.

-Pois.. é que assim não vai ser possível. Sabe como é, já cá temos três casados com dois filhos e o director já trepa pelas paredes por isso…. Nisso, como lhe disse, a empresa tem normas muito restritivas.
- Mas aí não há nada que possa fazer, tenho muito carinho aos miúdos e…
-Temos duas vagas para divorciados com dois filhos. Mas teria que me trazer os papéis de divórcio antes de assinarmos o contracto.

-Mas, isto é incrível…

-Tente entender, teria muito gosto em tê-lo nesta equipa, mas a empresa tem normas muito definidas acerca destes casos.

-Está bem. De acordo.

-Que estupidez a minha. Tem que me desculpar. Estive a fazê-lo perder o seu tempo. Não posso mesmo dar-lhe trabalho.

-Mas, que se passa agora?
-É a questão das quotas de mulheres. Tenho que contratar pelo menos 40% de elementos do sexo feminino e já não disponho de lugares para homens.
-Mas… não pode esperar que eu…

-Queira desculpar mas sabe bem que eu teria muito gosto em tê-lo na equipa, mas a empresa tem normas muito rígidas acerca de casos assim.

-E se eu vier vestido de mulher?

-E se vem uma inspecção de trabalho, já viu o que seria. Tente entender as normas da empresa.
-Não há nada que eu possa fazer?

-Bem se fosse uma operaçãozita…; Ao fim ao cabo hoje em dia já nem é nada de estranho é quase uma normalidade. Aí sim, então poderíamos avançar.
-Francamente mudar de sexo para conseguir um emprego
-Entendo. Não se preocupe, hão-de haver outros lugares noutras empresas, no entanto é pena. Paciência.
Boa tarde. O seguinte!
-Espere, espere… eu faço a operação! Mas nós ainda não falamos das condições do lugar, nem do salário, do horário nem de nada.
-Repare. O senhor cumpre com o que está a faltar e depois dessas coisitas, desses ajustamentos, volta cá com o novo B.I., o atestado de residência e o certificado do médico e então falaremos das condições. Bom dia Vitalina, com certeza iremos trabalhar muito bem consigo na equipa.
Seguinte!

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