quarta-feira, agosto 31, 2005

Bom Ano Novo


Amanhã começa um novo ano. O seu início não será assinalado pelas doze badaladas da meia-noite nem será celebrado com champagne e euforia generalizada. Nem sequer haverá festa, nem música ou os acepipes habituais. Também não haverá fogo-de-artifício e não se partem pratos velhos para quebrar os laços com o ano que termina… Bem… em relação a este último aspecto não posso dar qualquer garantia…
Não será feito um melancólico balanço do ano que agora finda porque esse balanço foi feito há um mês, quando onze meses de vida foram encaixotados ou arquivados. No entanto, e ainda que sem o ritual das doze passas, são formulados desejos e estabelecem-se objectivos e é frequente ouvir os habituais desejos de “bom ano. Palavras estas que têm, para mim, mais significado neste momento do que no dia 1 de Janeiro. Se temos 365 dias por ano para viver, porque nos sentimos obrigados a valorizar ou celebrar as datas que nos são impostas??? Para mim e para quem assim o entender Bom Ano Novo! (Ana)


sábado, agosto 27, 2005

DIZcionário (1)


Escrevível - adj.; aquilo que é passível de ser escrito. (Ana)

sexta-feira, agosto 26, 2005

Sabor do acordar


Acordar todos os dias, é sem duvida um estranho acto que praticamos sem muitas vezes sequer nos darmos conta de que o fazemos e como vai mudando a sua importância e o seu “sabor” ao longo dos anos da nossa vida. Inicialmente fazêmo-lo apenas por necessidade fisiológica: para comer, ou melhor, para sermos alimentados e “higienizados” ou apenas porque já não temos sono e temos muito a aprender com a observação do mundo. Mais tarde acordamos com a ideia fixa de brincar e continuamos a querer aprender com o mundo. Mas logo, começam as obrigações escolares e aí o acto simples de acordar ganha foros de obrigação, de perfeito dever. Também o seu sabor deixa de ser o sabor a pequeno-almoço e satisfação por mais um dia a preencher com correrias e saltos, com brincadeiras com os primos, os amigos, com a vizinhança e o gato ou cão. Agora o sabor é muitas vezes a sal de lágrimas contrariadas e a pressa para sair que já vai sendo hora. No entanto nesta altura o acordar ainda tem sabores variados: sabor a dia de festa lá em casa, sabor a dia de S. João, sabor a ida à praia, sabor a chegada da avó, sabor a Natal… quem não se recorda do sabor do acordar em dia de Natal? Ou do sabor do dia em que se vai fazer uma viagem que nunca se fez?

Pouco depois estes sabores ainda existem mas misturam-se já com outros mais adultos como o sabor do dia de prova de matemática, ou de dia de exame e aí, os sabores ganham um especial amargar nas manhãs.

Rui

quinta-feira, agosto 25, 2005

Nas nuvens


Toda a gente, pelo menos uma única vez na vida, passou algum tempo a olhar as nuvens no céu e a imaginar ver aí “coisas” reais. Sobretudo na infância, quantas vezes não demos por nós, deitados numa pedra ou num prado, na praia ou apenas na varanda a olhar as nuvens e a ver nelas tudo aquilo que desejávamos ver: elefantes, cisnes, pessoas conhecidas, navios… Eram sem duvida uns momentos divertidos e uma parte inesquecível da infância. Nessa altura não existiam as fronteiras de hoje à nossa capacidade de sonhar, éramos capazes de transformar agua sob a forma de vapor em todo o tipo de sonhos. Éramos capazes de ver o que queríamos ver. Agora, crescidos que somos, sentimos obrigação de ver tudo como os outros o vêm.

Recordei-me sem aparente motivo, ou talvez porque sempre me recorda, do meu pai. Recordei uma manhã, em que doente, perdia a primavera lá fora e apenas via o sol que entrava pela janela aberta de par em par no meu quarto de menino. Jogávamos cartas sobre a cama e ele falava comigo não sei acerca de que já, mas lembro que naqueles momentos me esquecia da primavera lá de fora, da escola e do tempo que já passara, primeiro no hospital e depois naquela cama. Ele sabia que assim era nesses momentos e fazia-o sempre que podia e conseguia poder muitas vezes.Sempre que se sentava comigo, ao fundo da cama trazia-me qualquer coisa nova, um livro ou uma história do seu tempo de criança; E eu que já não gostava que me contassem histórias ficava a ouvir com toda a atenção que podia fingir e acabava sempre por gostar e pedir outra e outra até à hora de almoço.

E hoje, quando pela janela do meu quarto olhei as nuvens, não foram animais nem cenas de fantasia que vi. Foi o meu pai, mas vi-o de uma maneira tão intensa e tão real como nunca pudera ver no céu nada nascido da minha imaginação nem na minha enorme saudade.

Rui

O mundo está cheio de...imbecis!


Aparentemente e erradamente ou não, cheguei à conclusão de que existem imbecis por todo o lado. E isto não é sequer nem apenas um fenómeno nacional. Estou convencido de que existem por esse mundo fora, variando apenas o seu grau e numero na inversa proporção do grau de civilidade que cada sociedade possui. Penso mesmo que não existirá ninguém que de um ou outro modo não tenha já sido confrontado com um destes imbecis. Existem em todas as formas, feitios e cores: altos, baixos, magros, gordos, atléticos, saudáveis, doentes, com e sem barba, com e sem cabelo. Mas uma característica comum parece uni-los a todos: a enorme dificuldade que todos apresentam em ter um comportamento em que não pareçam querer demonstrar que se acham superiores ao comum dos membros da sociedade em que (não) se integram. Seja pela fortuna pessoal que possuem, pelo cargo que desempenham, pela influência que exercem sobre outros imbecis ou apenas talvez por hábito, todos eles se consideram superiores a todos, excepto a um ou outro deles que por obra do acaso e de muita imbecilidade cometida ou dita se elevaram à condição de imbecil chefe. Também os há com características específicas e com sub-especialidades: autoritários, incompetentes, mentirosos, cravas, oportunistas e uma gama completíssima de outras tipologias que muitos conseguem combinar e dominar simultaneamente, cientes de que quanto mais completos forem, mais e melhor crédito poderão obter junto de outros como eles, como é o caso dos imbecis superiores.

Muitos poderão ter-se tornado imbecis por nascimento ou para seguir as pisadas de pais e avós que já o eram, outros sem tradição familiar, possuíam uma vontade férrea e determinada em o serem e conseguiram sem grande esforço, embora se gabem constantemente de o ter tido, chegar à sua actual condição. Mas existem outros e estes são talvez ou piores de todos, os mais vorazes e agressivos de toda a espécie dos imbecis: os imbecis voluntários. Normalmente não foram assim toda a vida e pior ainda tem consciência que são imbecis e que se realmente quiserem podem passar despercebidos entre o resto da humanidade. Regra geral tornaram-se como são por opção pensada, para não serem eles próprios vitimas dos outros imbecis, uma espécie de processo de osmose da imbecilidade. Chamo a vossa atenção para o perigo que constitui para qualquer pessoa, que não pertença à referida espécie, o encontrar-se com frequência na companhia deles, podem ser contagiantes caso não sejam tomados cuidados extremos de higiene, sobretudo mental. Por isso já sabe se tiver um no seu local de trabalho, se for professor, aluno, médico ou doente de um; Se for um o seu contabilista, empregado, patrão, ou se pior ainda tiver um na sua família….contacte-o o menos que lhe for possível. Se ele insistir em lhe falar, não lhe responda ou faça-o apenas por grunhidos ou monossílabos. Se tentar convidá-lo/a para jantar ou apenas para um copo, recuse com firmeza; Não assine nada que ele lhe peça para assinar, não leia os mesmos livros, nem leia nada que ele diga que deve ser lido, não veja os mesmos filmes, mas sobretudo não oiça as mesmas músicas nem fale com as mesmas pessoas. Mas pior, é se for colega de trabalho ou cônjuge de um ou uma…mude de emprego e divorcie-se; No entanto, convém que ao fazê-lo, esteja plenamente consciente de que não existe qualquer garantia de não lhe volte a suceder o mesmo. Porque como comecei por dizer, o mundo está cheio de imbecis. E alguns têm blogs.


Rui

quarta-feira, agosto 24, 2005

O tempo que não passa...


É incrível que o tempo passe por nós sem que nos apercebamos e só reparemos que ele passou pela imagem que recebemos dos outros.
Lembro-me que quando era criança ouvia muitas vezes a minha avó, com idade já bastante avançada, afirmar “Aquela rapariga é da minha idade” ou “Há muito tempo que não via aquele rapaz”. Eu procurava-os com o olhar e surpreendia-me ao constatar que a rapariga ou o rapaz eram uma senhora ou um senhor com uma respeitável cabeleira branca, ou a ausência dela, e que tinha no rosto as marcas deixadas pelas experiências da vida.
Mais tarde, observei que também os meus pais se referiam da mesma forma a pessoas que, não tendo ainda uma idade tão avançada, também estavam longe de ser o que eu considerava um rapaz ou uma rapariga. Para mim era muito estranho que eles não compreendessem que as pessoas a quem se referiam eram adultos! Eram os pais dos meus amigos e colegas da escola e esses sim eram rapazes e raparigas… como eu!
Continuo a surpreender-me mas já não com estes comentários, que à minha avó não terei oportunidade de voltar a ouvir. Agora surpreendo-me quando encontro rapazes e raparigas que foram meus colegas e verifico que dos meninos que eu conheci não restou nada além da cor dos olhos, do cabelo e algum gesto ou expressão. Agora são independentes, trabalham, formaram as suas famílias e muitos têm filhos. Os rapazes e as raparigas que brincavam comigo ou faziam tropelias na escola, agora são o bancário, o enfermeiro, o dono do café, o vendedor, o professor, o polícia, o advogado, o desempregado, o dentista, o mecânico ou o psicólogo…
Colocaram de lado a bola, as bonecas e os carrinhos. Já não usam mochila e quando compram cadernos, lápis e borrachas são para os filhos e interessam-se pelo preço. Já não correm na rua ou quando o fazem não se divertem, fazem-no com um ar comprometido ou furioso e é apenas para não chegar tarde ao emprego ou para não perder o autocarro.
Se me ocorre, em alguma circunstância, ser atendida por algum deles que não me reconhece trata-me por “senhora” e já não me tentam subornar para que os ajude nos testes em troca de lápis de colorir ou de uma pedra de forma irregular. Também já não discutimos para decidir quem tem o pai mais forte, o irmão mais chato ou a professora mais bonita.
Sabem o valor do défice, o preço da gasolina e o valor da prestação da casa mas não sabem o nome de todas as bonecas, quantos carros vermelhos passaram na rua na última meia hora nem quantos tinham matrículas com capicuas. Já não dizem ser o Homem-Aranha, a Super-Mulher ou o Batman. Alguns até esqueceram tudo o que queriam ser de tão ocupados que estão e se alguém lhes lembrar, provavelmente, vão dizer que é um disparate, uma idiotice de quem não cresceu e vive preso a recordações de infância.
Ganharam idade, ganharam poder, há quem diga que ganharam juízo. Tomam decisões, resolvem problemas, dão ordens fundamentadas por vezes, outras vezes apenas “porque sim” ou “porque não” como as que detestavam receber quando eram crianças. Alguns aprenderam técnicas infalíveis na arte de negociar ou seduzir e têm sucesso numa ou em ambas. Mas perderam a capacidade de se encantarem com uma gota teimosa que entra pela janela mal calafetada, com as poças de água nos dias de chuva ou com a lagarta verde que se passeia vagarosamente na folha de couve.
Também eu cresci. Também eu não sou a menina que era… Somos todos adultos, mas para mim são, e continuarão a ser, o rapaz ou a rapariga que brincava no recreio ou no jardim. E, mesmo com o actual cabelo grisalho de alguns e com o futuro cabelo branco e movimento condicionado de todos, vê-los-ei sempre com um sorriso no olhar, a brincar e a correr pela vida fora. (Ana)


terça-feira, agosto 23, 2005

VEREDAS


De uma qualquer maneira a vida é como uma vereda que temos que percorrer logo a partir do momento em que nela nos lançamos com o primeiro passo. É nela que fazemos caminho; Por vezes devagar, outras vezes de modo apressado, outras enérgicos e confiantes e outras ainda indolentes e desmotivados. E não deixa de ser interessante notarmos que todos, absolutamente todos, sabemos onde a vereda termina mas ignoramos tudo acerca do que até ao seu final iremos encontrar. O final está lá, vemo-lo de onde estamos nós a cada momento e quando nos voltamos para trás vemos o caminho percorrido mas não mudamos nada dele por não podermos e dizemos que somos nós que não quereríamos mudar ainda que pudéssemos. Todos os tropeções nos deixam na memória marcas, como pó na biqueira dos sapatos; Todas as escorregadelas nos ensinam que tipo de chão devemos evitar pisar. Cada passo é mais lento pelo peso desses receios e dessas experiências anteriores e chamamos idade a esse peso. Por vezes tentamos deitar fora alguma da carga que levamos connosco, libertamo-nos dela e temos a vã sensação de estar mais leves e de progredir melhor e a outro ritmo. Outras vezes encontramos no caminho alguém que nos ensina que podemos, mais do que andar apenas, correr pequenos pedaços saltitando alegres e felizes e fazemos o que resta da jornada ao lado dessa pessoa. Ajudamo-nos em tudo o que podemos, ultrapassamos obstáculos e tristezas e não cessamos de entrelaçar os dias e os passos nos passos e nos dias do outro caminhante.

Mas também existem ocasiões em que é a carga que trazemos, que nos faz caminhar curvados e de cabeça baixa, olhando apenas o chão e a ponta do calçado sujo e gasto. Aí, nem somos capazes de ver a paisagem ou quem connosco caminha, não sentimos mais que o próprio peso; Não ajudamos por não ver e não somos ajudados por não olharmos para ninguém.

Sempre acreditei que o peso que carregamos na sua maior parte é apenas aquele que queremos carregar. E que quando chega a altura de alijar algum dele e não o fazemos, estamos a ultrapassar em peso o que nos é pela vida permitido. E se o não fizermos, custa a respirar e o peito dói, os passos são tristes e nem os olhos nem a alma podem olhar a paisagem ou a felicidade. Uma por onde passamos e a outra que passa por nós.

Rui

Primeiro

Há uma preocupação acrescida quando se escreve o primeiro post. Ou talvez seja uma preocupação inventada por mim e que não se justifica, este até nem é o primeiro blog... E afinal um primeiro post não é um primeiro encontro onde há a preocupação da primeira impressão provocada. Não percebo porque me prendi a esta conversa de “primeiro”… eu que nem acredito na importância de um primeiro amor.
Mas adiante, tenho dificuldade em começar a colocar posts sem que antes tenha escrito algo parecido a uma introdução. Não sei se também terei dificuldade em terminar o blog sem que antes escreva algo que se assemelhe a uma conclusão. E eis que nestas poucas palavras acabei de revelar uma segunda característica minha: tendência para prever fins ainda no início. A primeira é evidente desde a primeira frase: tendência para complicar o que é simples :-)
E parece-me que ter-me revelado um pouco já é suficiente para tentativa de introdução.
(Ana)