Toda a gente, pelo menos uma única vez na vida, passou algum tempo a olhar as nuvens no céu e a imaginar ver aí “coisas” reais. Sobretudo na infância, quantas vezes não demos por nós, deitados numa pedra ou num prado, na praia ou apenas na varanda a olhar as nuvens e a ver nelas tudo aquilo que desejávamos ver: elefantes, cisnes, pessoas conhecidas, navios… Eram sem duvida uns momentos divertidos e uma parte inesquecível da infância. Nessa altura não existiam as fronteiras de hoje à nossa capacidade de sonhar, éramos capazes de transformar agua sob a forma de vapor em todo o tipo de sonhos. Éramos capazes de ver o que queríamos ver. Agora, crescidos que somos, sentimos obrigação de ver tudo como os outros o vêm.
Recordei-me sem aparente motivo, ou talvez porque sempre me recorda, do meu pai. Recordei uma manhã, em que doente, perdia a primavera lá fora e apenas via o sol que entrava pela janela aberta de par em par no meu quarto de menino. Jogávamos cartas sobre a cama e ele falava comigo não sei acerca de que já, mas lembro que naqueles momentos me esquecia da primavera lá de fora, da escola e do tempo que já passara, primeiro no hospital e depois naquela cama. Ele sabia que assim era nesses momentos e fazia-o sempre que podia e conseguia poder muitas vezes.Sempre que se sentava comigo, ao fundo da cama trazia-me qualquer coisa nova, um livro ou uma história do seu tempo de criança; E eu que já não gostava que me contassem histórias ficava a ouvir com toda a atenção que podia fingir e acabava sempre por gostar e pedir outra e outra até à hora de almoço.
E hoje, quando pela janela do meu quarto olhei as nuvens, não foram animais nem cenas de fantasia que vi. Foi o meu pai, mas vi-o de uma maneira tão intensa e tão real como nunca pudera ver no céu nada nascido da minha imaginação nem na minha enorme saudade.Rui
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